PENTECOSTAIS: Como identificá-los?

5 mar

         O primeiro grande desafio que se tem, ao estudar a tradição pentecostal, é classificar ou categorizar os grupos pentecostais existentes no mundo, ainda que seja de uma forma macro. Cada nova classificação gera críticas daqueles que não concordam com os critérios e modos que estas classificações são feitas. Anderson escreveu que “os pentecostais definiram-se por tantos paradigmas que a própria diversidade se tornou uma característica definidora de sua identidade”[1]. No entanto, algumas formas de identificação ou categorização do movimento pentecostal têm ganhado mais aceitabilidade nos centros acadêmicos. Listaremos duas delas abaixo:

Três Ondas (Tree waves)

A primeira destas formas é conhecida por três ondas e foi estabelecida por David Barrett e Todd Johnson para seus estudos estatísticos[2] sobre o pentecostalismo. As três ondas se referem ao: Pentecostalismo Clássico; Renovação Carismática; e Igrejas Independentes Pentecostais. Anderson alerta que embora “haja algum risco de reducionismo nessa classificação tripartite, ela é um ponto de partida útil”[3].

Geralmente, o Pentecostalismo Clássico (a primeira onda) é identificado com os movimentos que aconteceram no inicio do século XX, especialmente com Azusa Street e que tem em comum alguma “experiência pós-conversão”[4] do batismo no Espírito. Nalguns grupos pentecostais, o falar em línguas (glossolalia) é tido como a evidência inicial do batismo no Espírito Santo, embora muitos outros grupos que se identificam como Pentecostais Clássicos não façam tal revindicação. Menzies é um destes que revindica o falar em línguas como evidência e classifica os pentecostais com isto. Ele escreveu que Pentecostal é o:

cristão que crê que o livro de Atos fornece um modelo para a igreja contemporânea e, nesta base, incentiva todos os crentes a experimentar o batismo no Espírito (At.2;4) entendido como capacitação para missão, distinto da regeneração, que é marcado pelo falar em línguas, e afirma que ‘sinais e maravilhas’, inclusive todos os dons mencionados em 1 Co 12:8-10, devem caracterizar a vida da igreja hoje[5].

O Movimento Carismático (a segunda onda) é caracterizado pela “invasão” da experiência pentecostal ou carismática nas igrejas históricas e tradicionais. Anderson descreveu o grupo dos carismáticos “como aqueles que dentro de denominações antigas que tiveram uma experiência carismática”[6]. Geralmente, o inicio do movimento é associado ao caso padre Dennis Bennet, da Igreja Episcopal de Van Nuys, Califórnia e a repercussão que o caso teve em 1959, quando o padre anunciou que recebera o batismo no Espírito Santo e falara em línguas. Hyatt escreveu que “diferentemente dos pentecostais 60 anos atrás (se referindo ao início do século XX), os carismáticos foram aceitos em suas denominações”[7]. Sim, em grande medida, aqueles que tiveram a “experiência carismática” eram incentivados por seus líderes a permanecerem em suas igrejas que viram o movimento “como a maneira que Deus usou para renovar as denominações que existiam”[8]. Até mesmo a Igreja Católica se abriu para a realidade carismática e hoje, os católicos carismáticos representam uma grande parcela do catolicismo no mundo.

As Igrejas Independentes Pentecostais (a terceira onda) representam um conjunto de Igrejas que, mesmo distintas e separadas, estavam interligadas por suas práticas de ministério de curas e de manifestações pentecostais particulares atribuídas ao Espírito Santo, tais como: cair no poder de Deus, Dente de ouro, unção do riso, etc… Uma das igrejas que representa bem esta terceira onda foi a Associação Cristã da Vinha do Aeroporto, em Toronto, que teve um avivamento conhecido como a benção de Toronto. Hyatt escreveu que o avivamento foi “marcado por risada santa, queda no Espírito, estremecimento, curas divinas e outros fenômenos espirituais singulares”[9]. Avivamentos e fenômenos como estes se espalharam por todo o mundo nas igrejas pentecostais que não se identificavam com o pentecostalismo clássico e nem com o movimento carismático. Estas igrejas, nalguns países como o Brasil, receberam o nome de igrejas neopentecostais.

Evangelho Pleno (Quadrangular)

            Nas últimas décadas, alguns acadêmicos pentecostais têm laborado intensamente para descobrir os principais contornos da teologia pentecostal e, através dela, descobrir elementos de unificação do movimento pentecostal. Um brilhante e aclamado trabalho é o livro Raízes Teológicas do Pentecostalismo escrito pelo teólogo Donald Dayton. Nele o autor defende que, diferentemente daqueles que enfatizam a glossolalia como elemento unificador do movimento pentecostal, outros quatro elementos foram fundamentais para a formação do Ethos Pentecostal. São eles: Salvação, Batismo no Espírito, Cura e Segunda Vinda de Jesus. Ele escreveu que “o padrão de quatro-pontos oferece uma análise do Pentecostalismo que é suficientemente característica do movimento como um todo para ser empregado como base para sua análise histórica e teológica”[10]. Ele mostra que até mesmo, algumas igrejas adotaram, intencionalmente, esta moldura de quatro pontos como a base de seus trabalhos, como é o caso da Igreja do Evangelho Quadrangular.

            Salvação: a urgência na Evangelização e Salvação dos povos foi e ainda é uma marca distintiva do movimento Pentecostal como um todo. Anderson escreveu que “para os pentecostais, o evangelismo significa sair imediatamente e buscar os ‘perdidos’ para Cristo no poder do Espírito”[11]. Eles acreditavam que a segunda vinda de Cristo (outro tema do quadrante pentecostal) só aconteceria se todos os povos ouvissem a mensagem da salvação. As nações precisavam ouvir do Jesus Salvador.

            Batismo no Espírito Santo: para realizar a tarefa de Evangelizar os povos, os pentecostais clamaram por uma capacitação vinda do Espírito Santo. Eles criam que o Espírito, no seu sentido regenerador, era dado ao cristão no momento da sua conversão, mas criam que uma segunda benção era dada, ou seja, o Espírito era concedido para capacitar o cristão em sua tarefa de evangelizar. Inicialmente, o revestimento de poder ou “batismo no Espírito”, entre os metodistas, era associado a vida de santidade, mas, a medida que o movimento pentecostal tomava corpo, este revestimento ou batismo foi associado ao poder para servir, testemunhar e evangelizar.  Dayton informa que entre os primeiros pentecostais, houve “um esforço para manter-se a ideia de que o Pentecoste traria tanto ‘santidade como poder’”[12].

            Curas: consequentemente, os sinais e maravilhas acompanhariam os cristãos em sua tarefa evangelizar os povos, por meio de curas, sinais e maravilhas operadas pelo Espírito Santo. Dayton escreveu que “a celebração dos milagres de cura divina como parte inseparável da salvação que nos é dada por Deus, e que evidencia sua poderosa presença na vida da igreja, talvez seja mais característica do pentecostalismo até mesmo do que a doutrina do Espírito Santo”[13], ou seja, a crença na cura divina é um elemento que marca o pentecostalismo como um todo, independente de sua classificação tradicional, carismática ou neopentecostal. Anderson também confirma que o papel da cura divina “foi destacado na práxis e reflexão pentecostal e carismática em todo o mundo desde o início”[14].

            Segunda Vinda de Jesus: mas, o fio condutor para todas as ações (salvação, batismo e curas) era a expectativa da segunda vinda de Jesus. O tema escatológico estava fervilhando na virada do século XIX para o XX. Os cristãos se perguntavam se um milênio seria estabelecido ou não? Se este milênio traria melhorias ou não? O certo é que todos os pentecostais deveriam “abreviar” a vinda do rei Jesus evangelizando os povos. Num artigo escrito em 1890, esta verdade pode ser vista: “não se conhece uma pessoa em mil que tenha sido santificada e que não esteja procurando abreviar a volta do Senhor”[15] e o jornal Apostolic Faith de 1906 trazia as seguintes palavras: “este é um avivamento mundial, o último avivamento pentecostal para trazer nosso Jesus. A igreja está realizando sua marcha final para encontrar seu amado”[16].

            Dayton e outros autores defendem que estes elementos (salvação, batismo no Espírito, cura e segunda vinda de Jesus) foram os trilhos pelos quais o movimento pentecostal moderno se formou e, ainda hoje, se baseia como um ethos ou um imaginário pentecostal que o envolve e lhe dá o sentido unificador.


[1] ANDERSON, A. Uma Introdução ao Pentecostalismo. São Paulo: Edições Loyola, 2019. p.14.

[2] Ibid., p.15.

[3] Ibid., p.17.

[4] Ibid., p.15.

[5] MENZIES,R. Pentecostes: Essa História é a Nossa História. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 2020. p.16.

[6] ANDERSON, A. Uma Introdução ao Pentecostalismo. São Paulo: Edições Loyola, 2019. p.16.

[7] HYATT, E. 2000 Anos de Cristianismo Carismático. Natal, RN: Carisma Editora, 2018. p.222.

[8] Idem.

[9] Ibid., p.233.

[10] DAYTON, D. Raízes Teológicas do Pentecostalismo. Natal, RN: Carisma Editora,2018. p.52.

[11] ANDERSON, A. Uma Introdução ao Pentecostalismo. São Paulo: Edições Loyola, 2019. p.232.

[12] DAYTON, D. Raízes Teológicas do Pentecostalismo. Natal, RN: Carisma Editora,2018. p.161.

[13] Ibid., p.191.

[14] ANDERSON, A. Uma Introdução ao Pentecostalismo. São Paulo: Edições Loyola, 2019. p.251.

[15] Cf. DAYTON, D. Raízes Teológicas do Pentecostalismo. Natal, RN: Carisma Editora,2018. p.285.

[16] Cf. ANDERSON, A. Uma Introdução ao Pentecostalismo. São Paulo: Edições Loyola, 2019. p.220.

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